quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Uma multidão enclausurada

Por Gustavo Di Lorenzo

Existem frases que nos fazem pensar. Pensar muito, em alguns casos. Há alguns meses, eu estava sentado em um albergue, escutando uma conversa entre um escocês e um irlandês, em que eles discutiam suas carreiras. Enquanto o irlandês contava que trabalhava em uma empresa e ganhava sei lá quanto por mês, o escocês falava do seu próprio negócio que estava começando a dar certo, e da sociedade que iria fechar em alguns dias.
Conversa vai, conversa vem, e o escocês contou que largou a escola no começo da adolescência. Nessa hora eu tive que entrar no assunto para entender como alguém sem ensino básico e superior conseguia ser tão bem sucedido na administração de uma empresa.
A conclusão da conversa? O sentido de “educação” mudou com o tempo.
Se um dia educar foi ‘ensinar’, hoje é ‘preparar’. E isso muda muita coisa. Ensinar é transmitir conhecimento, desenvolver o saber, ministrar o entendimento – já preparar é condicionar, induzir, aprontar para algum fim.
O processo de educação deixou de focar no crescimento do indivíduo e passou a tratar de seu encaixe na sociedade. ‘Estuda, daqui uns anos tem vestibular’. ‘Estuda, sem diploma você não arranja emprego’. ‘Trabalhe muito para dar conforto para sua família… quando você tiver uma’.
A escola e a universidade, enquanto deveriam ser ambientes de aprendizado, tornaram-se fábricas de profissionais e impressoras de diplomas. O saber passou a ser visto como algo objetivo, enquanto é uma das funções mais subjetivas do ser humano. A História, por exemplo, é ensinada a partir de um ponto de vista fixo, sem opiniões, discussões ou críticas… é apenas contada. Lembro também das aulas de redação, em que ninguém ligava para a qualidade do texto ou a criatividade do autor – o que importava era apenas seguir as regras da dissertação (que era o formato do vestibular).
A academia é enclausuradora, enquanto deveria ser libertadora.
Eu nunca ensino aos meus alunos; Eu apenas tento proporcionar as condições nas quais eles podem aprender.
(Albert Einstein – a.k.a. O homem mais inteligente da história)
Já a família, que deveria transmitir valores e formar indivíduos íntegros, passou a ser uma estrutura de condicionamento infantil – que só ensina a estudar, crescer, trabalhar, procriar e enriquecer.
No nosso cotidiano, é comum vermos pessoas que queriam estudar artes e foram obrigadas, por seus pais, a irem para uma área mais “segura”, como engenharia, direito ou medicina. A estabilidade social (família, dinheiro, sucesso) tornou-se o fim, não a consequência. A normalidade agora é norma. E ai de quem não se encaixa dessa fórmula.
É difícil identificar um culpado. A família não tem culpa, essa clausura vem acumulada por gerações. A academia, hoje vista como mercadoria, corresponde à demanda existente. A criança não tem escolha, o adulto já passou pelo processo (e muitos sequer notam) e o adolescente, que é quem deveria ter a liberdade para fugir do formato imposto, está ocupado demais em suas dezenas de abas.
Existem frases que nos fazem pensar. Naquela conversa, com o escocês, surgiu a que me fez refletir sobre tudo isso e escrever esse texto – que eu poderia ter chamado de ‘Uma introdução a desescolarização’:
A escola é para crianças com pais que não pararam para pensar sobre o que é escola, pois estavam preocupados demais trabalhando. 

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